Tirzepatida, concorrente do Ozempic, chega no Brasil em 2024

Postado por: Lucas Gazarini

As postagens por aqui andam até um pouco monotemáticas, por isso peço desculpas para quem não aprecia o assunto. A semaglutida (Ozempic® e Wegovy®) já foi alvo de postagens “recentes”, desde que se tornou um medicamento blockbuster. Sua aprovação no Brasil para o manejo da obesidade e nova indicação para redução do risco cardiovascular ganharam destaque. Mas a corrida pelos medicamentos antiobesidade continua no centro das atenções, então é impossível ignorar o assunto.

A bola da vez é a tirzepatida. Tanto ela quanto a semaglutida mimetizam a ação do peptídeo semelhante ao glucagon-1 (GLP-1). Somente a tirzepatida, contudo, também ativa receptores do polipeptídeo insulinotrópico dependente de glicose (ou peptídeo inibitório gástrico; GIP). As ações nos dois sistemas de incretinas conferem um perfil de ação adicional em comparação à semaglutida, com possíveis vantagens. A inovação é um ponto chave, porque ela não é um simples fármaco “me-too“, que tem estrutura química e perfil de ação quase idênticas a outro já disponível no mercado. Por isso, a tirzepatida ganhou os holofotes no cenário dos novos emagrecedores.

 

Uma “velha nova” opção

Em 2022, a tirzepatida foi aprovada para o tratamento de diabetes tipo 2 nos EUA, como Mounjaro®. Naquele momento, o potencial emagrecedor do medicamento já era descrito em estudos clínicos. Tudo isso já foi abordado em uma postagem anterior, leitura recomendada para se situar (veja no card abaixo).

 

Novo fármaco para tratamento de diabetes tipo 2 pode ter uso em obesidade

 

Algumas coisas mudaram nesses 2 anos. A tirzepatida também foi aprovada para o manejo do diabetes pela ANVISA, em setembro de 2023. Em novembro do mesmo ano, a FDA estendeu o uso da substância para o controle do sobrepeso e obesidade, nos EUA. O medicamento aprovado para esse fim, no entanto, foi registrado como Zepbound®, da Eli-Lilly. Como o Mounjaro®, o medicamento é disponível em canetas injetoras de uso único, com doses de 2,5 a 15 mg. A criação de “um novo medicamento” com a mesma substância é uma estratégia para facilitar pesquisas de mercado sobre a venda dos produtos.

 

Novos estudos reforçam o efeito da tirzepatida na perda de peso

A imagem traz a apresentação farmacêutica do medicamento Zepbound®, com o princípio ativo tirzepatida. Trata-se de uma caneta injetora plástica branca em posição vertical, com um botão injetor roxo e extremidade oposta em plástico transparente, possibilitando a visualização da solução injetável. A agulha é protegida por uma capa cinza. Em verde, o nome do medicamento é posicionado ao centro da caneta, indicando a dose de 2,5 mg.

Zepbound®, novo medicamento para perda de peso. Fonte: Eli-Lilly.

Um dos estudos que embasou a aprovação da tirzepatida na obesidade já foi discutido na postagem acima. Contudo, novos estudos foram decisivos para a aprovação pela FDA.

Um mês antes da aprovação nos EUA, novos resultados do estudo SURMOUNT-3 (NCT04657016) foram publicados na revista Nature Medicine. Pessoas com índice de massa corporal (IMC) ≥ 30 kg/m2 ou ≥ 27 kg/m2 associado a alguma comorbidade foram selecionadas para participar. As comorbidades associadas à obesidade incluíram dislipidemias, hipertensão e apneia do sono. Pacientes com diabetes foram excluídos, já que o propósito era avaliar se o efeito emagrecedor acontecia mesmo em pessoas sem essa doença. Os participantes (n=579) receberam injeções semanais de tirzepatida (10 ou 15 mg, o máximo tolerado individualmente) ou placebo, durante 72 semanas.

Ao final do período de testes, o uso da tirzepatida resultou em:

  • Perda de 18,4% do peso inicial (vs. 2,5% no grupo controle);
  • Diminuição de 14,6 cm na circunferência abdominal (vs. aumento de 0,2 cm no grupo controle);
  • Redução na pressão arterial (sistólica e diastólica);
  • Melhora no perfil metabólico (triglicerídeos, colesterol e glicemia);
  • Redução ≥ 5% no peso corporal em 87,5% dos participantes (vs. 16,5% do grupo controle);
  • Perda de ≥ 25% do peso corporal em 36,3% das pessoas (vs. 0,3% no grupo controle).

 

Limitações e perspectivas na perda de peso

Esses resultados são até um pouco alarmante, pela magnitude na perda de peso. Alarmante ao pensar no acesso a essa substância por pessoas com transtornos alimentares, como anorexia. Ou no uso indiscriminado/abusivo e sem acompanhamento multiprofissional. Já existem burburinhos de celebridades que emagreceram importando tirzepatida, no submundo das fofocas. Já antecipando, o impacto vai ser grande.

Alguns estudos mais recentes, publicados em 2024, indicam que o ganho de peso é comum após a descontinuação do tratamento. Apenas 16,6% das pessoas que usaram a tirzepatida por 36 semanas conseguiram manter ao menos 80% do peso perdido um ano depois.

Ou seja: a tirzepatida é muito eficiente na perda de peso, mas não é a solução definitiva. Parece ser uma ótima ferramenta adjuvante, mas a manutenção do peso final envolve mudanças maiores. É importante ressaltar que os testes clínicos sempre acontecem associando o medicamento com mudanças em hábitos de vida. Então, parte dos efeitos também resultam das alterações na alimentação e rotina de exercícios: não existe medicamento milagroso.

 

Foi aprovado, e agora?

A aprovação como emagrecedor no exterior repercutiu no Brasil, mesmo que esse uso ainda não tenha sido aprovado pela ANVISA. Obviamente, a aprovação pela FDA respalda a prescrição off-label da substância no manejo do sobrepeso e obesidade. As evidências para esse uso existem e são sólidas, então essa indicação é racional. É claro que isso não é um aval para a automedicação e abuso desse medicamento, como vem acontecendo.

Seguindo o que aconteceu com o Wegovy®, a aprovação do Zepbound® no Brasil deve acontecer em pouco tempo. Mais ainda porque é interesse direto da Eli Lilly registrar um “concorrente” para a semaglutida, da Novo Nordisk. Meses após a aprovação nos EUA, as farmácias já enfrentam falta de estoque do Zepbound®. Então é muito provável uma nova corrida por esse medicamento e “divulgação” em redes sociais, como aconteceu com o Ozempic® nos últimos anos. Os impactos econômicos em bolsa de valores já começaram.

No país, o Mounjaro® ainda não chegou às farmácias. A bula em português já está disponível, indicando o uso para diabetes tipo 2, único aprovado no país até o momento. O início das vendas deve acontecer nos próximos meses, conforme a venda seja normalizada no exterior. Os preços devem ser maiores que o do concorrente, o que fez o medicamento ser apelidado de “Ozempic dos ricos“.

Comentários

  1. Loiva vitoreti madeira disse:

    Não quero emagrecer é o diabetes

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