Ozempic vai estar disponível no SUS?
A resposta direta é: não — pelo menos não por enquanto.
A decisão sobre a incorporação de um novo medicamento ao Sistema Único de Saúde (SUS) passa por uma avaliação rigorosa do balanço entre custo e efetividade. Esse processo é conduzido pela Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no Sistema Único de Saúde (CONITEC), que realiza uma análise técnica e detalhada de todos esses pedidos. Como diversos fatores são levados em conta, os motivos para a negativa podem, muitas vezes, gerar dúvidas.
A eficácia dos análogos de GLP-1 injetáveis — como a liraglutida (Saxenda® e Victoza®), semaglutida (Ozempic® e Wegovy®) e tirzepatida (Mounjaro®) — é amplamente reconhecida, tanto no controle do diabetes tipo 2 quanto na redução de peso (veja mais aqui, aqui e aqui). Diante da escassez de outras opções eficazes e seguras para o tratamento da obesidade, o potencial benefício para os pacientes também parece evidente. Ainda assim, o fator econômico pesou mais na decisão final.
Viabilidade econômica na incorporação de novos tratamentos no SUS
Como a maioria desses medicamentos ainda está sob patente, o custo tende a ser alto — especialmente no caso dos lançamentos mais recentes, como a tirzepatida. Diante dos dados epidemiológicos da obesidade no Brasil, que afeta mais de 25% da população, e da perspectiva de tratamento crônico, o impacto financeiro para o sistema de saúde seria expressivo. Nos últimos anos, as vendas desses medicamentos cresceram de forma acelerada, levando a medidas regulatórias como a exigência de retenção da prescrição e até a restrição na manipulação da semaglutida (que pode ser estendida para a tirzepatida, em breve). Esse cenário reforça a possibilidade de que a oferta de análogos de GLP-1 no SUS poderia ser associada a um aumento acentuado das prescrições, nem sempre de maneira racional.
A análise de farmacoeconomia é central nesse debate, porque busca otimizar o uso de recursos financeiros sem comprometer a qualidade dos tratamentos disponíveis no SUS. Em um cenário ideal, todas as novas terapias eficazes deveriam estar disponíveis, garantindo o acesso amplo da população. No entanto, a incorporação indiscriminada de tratamentos de alto custo poderia sobrecarregar o orçamento e inviabilizar outros serviços de saúde, mesmo os mais essenciais. Trata-se, portanto, de um equilíbrio delicado: o benefício de alguns frente às necessidades de muitos. Por essa razão, a CONITEC decidiu não recomendar a incorporação das “canetas emagrecedoras” no SUS.
Hoje não, mas talvez no futuro…
A decisão recente da CONITEC tratou dos pedidos de incorporação da liraglutida e da semaglutida para o tratamento de pacientes com obesidade, mas sem diabetes. Relatórios preliminares de 2023 e 2025 já indicavam a não recomendação, confirmada no fim de agosto. Sociedades médicas criticaram esse parecer, argumentando que a medida reforçaria a ‘elitização’ desses tratamentos, restritos a poucos pacientes. Embora esse ponto seja válido, a decisão da CONITEC se fundamentou na viabilidade econômica de fornecer continuamente esses tratamentos no SUS. É importante lembrar que o debate também é permeado por conflitos de interesse com a indústria farmacêutica e prescritores. Por exemplo, a Novo Nordisk — detentora das patentes dos dois fármacos avaliados e principal interessada no processo — manifestou-se contra a decisão. Considerar os dilemas éticos e morais envolvidos nessa discussão é fundamental.
Mas então, nada de Ozempic no SUS? Pelo menos por enquanto. Na decisão, a CONITEC mencionou a perspectiva de reavaliação dos pedidos, conforme os preços caiam. A expiração da patente da liraglutida e o registro de similares produzidos no Brasil já apontam nessa direção. A proximidade do fim da patente da semaglutida também abre espaço para a redução nos preços e o desenvolvimento de genéricos. Além disso, a Fiocruz firmou parceria com a EMS para produzir esses medicamentos a menor custo, o que melhora as perspectivas de incorporação no SUS, futuramente.
Essa pergunta foi enviada por um leitor do site. Você também pode ter a sua dúvida respondida, basta acessar o Respondendo Farmacologia e preencher o formulário!